sexta-feira, 31 de julho de 2009

Curandeiro

A semana passada, o meu empregado contou-me que o seu irmão estava no sofá a ver televisão e, quando se quiz levantar não conseguiu. Ficou sem andar e com o braço esquerdo paralisado.
Levado para uma clínica, foi submetido a uma série de exames, que ele não me soube dizer quais, bem como não me soube dizer qual o diagnóstico.
O caso deve ter alguma gravidade: ficar de repente sem acção nas pernas e num braço não parece um bom sinal. É provavelmente algo que não se cura de um dia para o outro.
Ontem perguntei-lhe pelo irmão, ao que ele me disse que tinha deixado a clínica e ia agora a um curandeiro. Fiquei sem saber o que dizer: por um lado, para a minha mente ocidentalizada e científica, acho que é um erro. Mas ele (o irmão) parece acreditar, e não ia mudar de ideias devido à minha opinião. Assim, se vai ao curandeiro, pelo menos que leve a fé.

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Livros de almoço

Durante a semana, normalmente almoço em casa, e torna-se um momento do dia que gosto particularmente.
Gosto porque me permite fazer uma pausa muito agradável, em que ponho a tocar a música que me apetece e acompanho com um livro. E livros e música são para mim uma combinação excelente.
Assim, do mesmo modo que há quem tenha livros de casa de banho, eu tenho livros de almoço. E que bem que me sabe!

terça-feira, 28 de julho de 2009

Diferenças culturais?

Há coisas que nos apanham de surpresa, e que não são fáceis de justificar com diferenças culturais. Mas é possível que assim seja.
Hoje recebi a visita de uma pessoa no meu local de trabalho. Uma pessoas que é fumadora, mas até aí não tenho muito contra. Já tenho contra o facto de começar a fumar dentro do meu gabinete, e de o ter de mandar para a varanda. E finalmente mas não menos importante, incomoda-me o facto de ter atirado a beata para o meu chão da minha varanda, e de o ter de obrigar a apanhá-la para a deitar na sanita, visto que não tenho cinzeiros.
Volto a dizer que podem ser diferenças culturais, mas confesso que tenho alguma dificuldade.

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Tanto faz

A data das eleições aproxima-se. Entre uns que dizem que vão ser feitas, e muitos que duvidam, a verdade é que a própria classe política não parece inteiramente convencida. Ou interessada.
Hoje, uma das gordas do jornal trazia a declaração duma das figuras políticas da praça: diz ele que o mais importante não é a data, que mais mês, menos mês, tanto dá. E remata com um "o mais importante é que se realizem".
Eu já estive mais certo de que as eleições serão feitas. Pensei que por aqui já estavam cansados dos problemas, e que a pressão da comunidade internacional ia ajudar. Mas o tempo passa e vejo demasiadas oscilações. Além disso, dizia-me um amigo na semana passada: "há 7 anos que cá estou e desde sempre ouvi falar das eleições. Acho que mais 7 também não fazem grande diferença". O que só dá razão ao outro: tanto faz.

domingo, 26 de julho de 2009

Cor

Recentemente conheci um francês aqui em Abidjan, com quem tenho estado algumas vezes e tem sido bastante interessante, com algumas discussões sobre temas vários e frequentemente com pontos de vista muito distintos.
Ele é chefe de cozinha. É de Lyon, viveu alguns anos em Dakar, trabalhou em Londres, Colónia e Paris. E recentemente veio para Abidjan.
Apresentei o percurso dele porque acho que não é alheio ao interesse das discussões. Não quero com isto dizer que quem não viaje ou não tenha trabalhado em vários sítios não seja interessante. Mas quem o fez acaba por ganhar mundo, ter perspectivas diferentes, sofrer influências que disputam as próprias ideias. E assim, a partilha ganha mais cor.

sábado, 25 de julho de 2009

Dois pares de meias

Dois pares de meias finais, foi o meu programa televisivo desta tarde, num sábado passado tranquilamente em casa.
Eu adoro desporto, e gosto de assistir ao vivo ou na televisão. E hoje tive a sorte de apanhar as duas meias finais do torneio de ténis de Hamburgo, e as duas meias finais do mundial de voleibol, a decorrer na Sérbia.
Assim, comecei por uma meia final de ténis, a seguir passei pela meia de vólei, voltei ao ténis e terminei com o vólei. Ufa, quase deu para ficar cansado de tanto ver correr.

Assédio

A homossexualidade não é, sinceramente, algo que me incomode. Nem é, sequer, algo sobre que faça juízos de valor. Mas confesso que fiquei surpreendido por, pela primeira vez na minha vida, ter sido abordado abertamente por um homossexual, e ter sido aqui em Abidjan.
Assédio de raparigas existe em praticamente em todo o lado, seja em bares, discotecas, hotéis ou na rua. Quando se sai à noite, onde quer que se vá, há sempre em maior ou menor quantidade. Entre homens é bem mais raro, mas aconteceu.
Foi no Mix, uma discoteca muito simpática na Zone 4. Entre umas músicas bastante dançaveis, aproximou-se um jovem que a determinada altura já estava demasiado perto. E eis que, disfarçadamente, me pegou na mão!!
Ainda pensei que fosse a rapariga que estava ao lado, mas após breve confirmação, era mesmo ele. O esclarecimento foi rápido, e nada mais se passou, mas a surpresa ficou.

quinta-feira, 23 de julho de 2009

CD riscado

A vida "moderna" é feita a correr. O tempo escasseia, é preciso encontrar soluções. E eis que aparecem as saladas pré-preparadas. Mas há mais consequências, que também se notam na televisão.
Há um canal de notícias chamado "i Tele" que não se consegue ver durante mais de 15 minutos, porque por essa altura já deu o mesmo telejornal 2 a 3 vezes. É basicamente um concentrado de notícias, e presumo que este modelo seja a pensar na malta das saladas.
Recentemente, aventurei-me a ver o tal canal durante 30 minutos, e também cheguei à conclusão que os repórteres dos directos devem pensar que são papagaios, de tantas vezes têm de repetir a mesma coisa em tão pouco ! Não deixou também de ser giro ouvir o apresentador dizer "nova edição já de seguida"... e era mesmo de seguida, e o mesmo apresentador, e as mesmas notícias e os mesmo directos. Se fosse um CD, diria que estava riscado.

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Documentário

Parece que há relativamente pouco tempo passou na televisão portuguesa um documentário sobre Abidjan. E diz quem viu que os três temas escolhidos para retratar a cidade não foram muito favoráveis. A saber: o lixo, o trânsito e a prostituição.
O denominador comum aos três é a quantidade. Muito lixo, muito trânsito, muita prostituição. E o pior é que é verdade.
Infelizmente, não são características raras em muitas outras cidades, africanas mas não só. E assim não admira que eu não tenha muitas visitas.

Síndrome do credor

A notícia é clara a condenar Guardiola, treinador do Barcelona: como se atreve ele a não estar interessado em Eto'o?
Independentemente do valor do jogador, há já muito tempo que ele demonstra ter uma personalidade complicada, difícil de gerir no seio dum grupo de trabalho. Aliás, não foi nem é o valor futebolístico de Eto'o que está a ser posto em causa, e com certeza que nenhum clube toma de ânimo leve uma decisão de se separar do melhor marcador da equipa da época passada.
A mim, tanto me dá se as pessoas são brancas, negras ou amarelas. Até podem ter pintas. E irrita-me a descriminação (negativa e positiva), praticada por quem quer que seja, assim como este "síndrome de credor" que conduz qualquer acção para a esfera do racismo e do colonialismo. Irra!

Mensagens de fugida...

Talvez tenham notado que há dois dias que não actualizo o blog: estou com problemas na internet em casa, o que me está a causar problemas para publicar esta mensagem número 300.
Assim, e enquanto não resolver os tais problemas, as mensagens vão ser de fugida, em horas de intervalo ou de final do trabalho. São as condições actuais, há que encontrar soluções. Mas espero que passe rápido, porque o blog já me faz falta.

domingo, 19 de julho de 2009

Georomantismo

Apenas hoje me apercebi da influência da geografia nos símbolos do romantismo.
A maioria da costa portuguesa está virada a Poente, pelo que o sol se deita sob a linha do horizonte. Além duma vista desimpedida, o reflexo na água completa o cenário, e uma passagem pela praia é sempre inspiradora.
Mas aqui, a praia está virada a Sul. E por isso, o por do sol fica alinhado pela praia, escondendo-se por detrás dumas árvores e dumas palhotas. Não é a mesma coisa...

sábado, 18 de julho de 2009

Sesta

Barriga cheia e uma temperatura agradável são boa condições para fazer uma sesta. Foi o que fiz esta tarde, e soube-me muito bem.
De manhã fui trabalhar, mas após almoçar estendi-me a ver televisão. Escusado será dizer que televisão foi o que menos vi: adormeci e acordei duas horas depois. Falta agora ver se não me vai afectar o sono da noite, mas foi tão bom que voltaria certamente a fazê-lo.

Sinais de luzes

Lembram-se quando um sinal de máximos significava que a polícia estava próxima? Decerto não, porque é uma prática em vias de extinção... Mas não em todos os sítios.
Aqui, logo que uma operação stop é vista, tenta-se avisar tantos condutores quanto possível, com sinais de máximos insistentes. É em parte uma reação quase natural, aos polícias com radares escondidos no meio das plantas dum horto, atrás duma bananeira ou no meio das ervas. É sobretudo uma reacção contra os crimes de extorsão praticados pelos agentes da autoridade.
Estou, assim, convencido que um aumento da confiança na polícia e nas suas intenções será acompanhada por uma diminuição dos sinais de luzes. Mas vai ser um processo longo.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Chuva e camiões

Chuva juntamente com camiões, é uma óptima combinação para destruir estradas. E onde houver muito dos dois, mais ainda.
Chuva é certo que há aqui com fartura, sobretudo nesta época. E na zona do porto de Abidjan, camiões são o que não falta. Logo, se a estrada lá já estava em más condições dada a intensa utilização, agora está quase impraticável. Tem várias piscinas (quando não está a chover), que se transformam em rios (quando volta a chuva), e buracos que apenas os todo-o-terreno e os camiões conseguem ultrapassar. Mas não os carros de passageiros, que ficam apoiados no chão, ou então com algumas peças espalhadas em caso de má pontaria.
Consequência: engarrafamentos infernais, impaciência, impossibilidade de respeitar horários. Talvez fosse boa ideia arranjar a estrada, antes que os buracos dum lado e outro se liguem e ela fique verdadeiramente cortada.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Surpresa

Aconteceu-me algo que pensei ser impossível aqui, e que passo a partilhar.
Precisei de ir à esquadra da polícia para obter o certificado de residência. Traduzindo, precisei de me dirigir a um organismo público, em que as pessoas andam de uniforme, para obter um documento assinado por alguém que manda.
Consciente do que acontece na estrada, e um pouco por todo o lado sempre que há uma "necessidade", ia preparado para resistir o melhor possível (ou direi antes negociar?) às condições extra que me pedissem. Surpreendentemente, nada se passou. Ninguém se insinuou, ninguém me pediu nada, e entregaram-me o certificado poucas horas depois. Com esta não contava.

terça-feira, 14 de julho de 2009

Rue 12

Notícia do dia: na Rue 12, em Treichville, um homem não gostou do trabalho dum outro, e deu-lhe um tiro. Entre a morte e um ferimento grave, ainda não sei qual foi o resultado ao certo.
O que é certo é que este episódio descambou numa pequena guerra. O agressor é um libanês, o agredido um costa marfinense. E aqui, entre libaneses e costa marfinenses, o clima é sempre de tensão e as consequências não foram insignificantes: um grupo de jovens costa marfinenses, não necessariamente amigos do agredido mas simpatizantes da causa, destruiram e saquearam uma série de lojas na referida rua. Veio a polícia de intervenção, o gás lacrimogéneo e presumo que as coisas tenham acalmado.
No entanto, o episódio não é desprezável e demonstra como é possível despoletar algo de grave, de dimensões maiores. Espero que fique por aqui.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Anne Marie

Anne Marie: é esse o nome da empregada de limpeza sobre quem vou escrever esta crónica.
Quando cá cheguei e falei com ela para firmar o nosso acordo de trabalho, timidamente ela disse-me que duas tardes por semana tinha aulas. Pareceu-me que ela pensava que isso impediria a sua contratação.
Não só não impediu como uma das condições para ser contratada foi não abandonar a escola. Porque ao final de tantos anos sem saber ler nem escrever (ela está na casa dos 40 anos), pareceu-me apropriado apoiar a sua vontade de aprender.
Durante este ano, por várias vezes me mostrou os seus cadernos, os seus trabalhos de casa, os seus exames. Há uns meses percebi que a sua maior dificuldade estava no francês, pelo que a aconselhei a ler bastante e, passados uns dias, ofereci-lhe o "Principezinho" de Saint Éxupery.
Hoje, a Anne Marie veio ter comigo para me dizer que tinha acabado de o ler. Além disso, tinha gostado muito. E melhor ainda, percebeu no essencial a mensagem.
Confesso que fiquei muito contente, a raiar o emocionado, tal como ela: julgo que foi o primeiro livro que leu, e penso que há uns meses ela não se imaginava sequer capaz de o fazer. A sua vontade de aprender é um exemplo para muita gente, e não apenas em África.

domingo, 12 de julho de 2009

Equilíbrio

Este fim de semana foi agradável, tendo contado com descanso, leitura, desporto e até algum sol. Mas não deixou de ser um fim de semana solitário, incompleto.
Na realidade, ainda que não tenha estado sempre sozinho, também não estive com aqueles de quem mais gosto, e isso faz com os fins de semana nunca sejam excepcionais.
Já perceberam, certamente, que são as saudades a falar. Saudades com as quais, com algumas pontuais excepções, acho que lido bem: sinto que é um exercício mental constante, mas não as deixo, nem posso deixar, chegar a ser dramáticas. E de fim de semana em fim de semana, aqui ando neste equilíbrio.

Zigue zague

Quando regressei a Abidjan desta vez, a minha rua parecia ter sido bombardeada, de tantas crateras que tinha.
Após alguns dias a fazer zigue zague para escapar a buracos capazes de partir suspensões e rebentar pneus, eis que os trabalhadores apareceram para corrigir o problema. Trabalharam um dia inteiro (incluindo parte da noite) e os buracos desapareceram. Momentaneamente, pelo menos.
É que logo no dia seguinte, choveu. E como devem ter usado uma "cola" de má qualidade, lá se foi o alcatrão que utilizaram. Voltaram as crateras, voltou o zigue zague.

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Serão

Antes de jantar apetecia-me ir tomar um café fora após a refeição. Mas lá fora está muito escuro: esta parte da cidade está sem iluminação pública desde há uns dias. Além disso, hoje foi um dia de chuva torrencial, pelo que a noite pode ser igual. E finalmente, o sofá convenceu-me.
Assim, vou ficar por aqui, a ver filmes aos bocados e a ler as memórias de Che Guevara sobre a guerra da revolução cubana. Não é um mau programa.

Férias escolares

As férias escolares começaram aqui em Abidjan. O que significa um aumento dos vendedores de rua.
Em Portugal, uma boa parte dos miúdos não podem sequer atravessar a rua sem serem acompanhados duma mão adulta, mesmo que no verde e numa passadeira. Aqui, vão para o meio do trânsito vender pastilhas elásticas. É uma forma das famílias terem uns rendimentos extra, mas não deixa de ser impressionante ver crianças de 8, 9, 10 anos a fazer slalom entre carros, motos e autocarros, correndo atrás das janelas abertas a oferecer o que têm para vender.
Só uma vez vi um deles atropelado, mas julgo que deve ser mais frequente do que isso. Porque eles são muitos, e os veículos ainda mais. E apesar de uma maturidade forçada, não deixam de ser crianças. E assim vão ser os próximos 3 meses.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Conhecimentos

Hoje fui jantar com um amigo senegalês. Chamar-lhe amigo será um pouco exagerado: conheci-o ontem na pré-viagem e viagem entre Paris e Abidjan.
Eu tenho uma simpatia especial pelos senegaleses. Penso que têm uma forma de estar que encaixa na nossa, e acho-os afáveis e simpáticos. E julgo que quando se viaja mais frequentemente, acaba-se por ter mais tendência para conhecer pessoas nos aeroportos e aviões. Ocasionalmente, encontram-se pessoas muito interessantes, e a pouco e pouco cria-se uma rede de amigos e conhecidos espalhada pelo mundo.
E assim, tenho agora casa em Paris e Dakar. Em troca, ofereço casa no Porto e Abidjan. Não me parece nada mal.

terça-feira, 7 de julho de 2009

Expansão

Regressei hoje a Abidjan. Olhando para o calendário, já faz mais de um ano desde que aqui cheguei pela primeira vez, a 28 de Junho do ano passado.
Ao contrário dessa ocasião, em que o céu estava limpo, desta vez fui recebido por um tempo chuvoso. O calor mantém-se, mas não deixa de ser engraçado como já não noto, ou pelo menos como já sinto menos as mudanças de condições.
Num ano tanta coisa muda! Mudam as condições, muda a cidade, muda a nossa relação com ela. É evidente que me sinto hoje muito mais ágil, muito mais à vontade em Abidjanm apesar de continuar a ser uma relação, atrevo-me a dizer, profissional. Toda a emoção está a muitos quilómetros daqui, tal como acontecia há um ano. Mas a expansão continua, e o balanço é muito positivo.