Bilhete perdido

Hoje fiquei a conhecer a história de um dos professores de ténis do clube onde costumo ir. É uma história triste, em que um momento define toda uma vida.
Em pequeno, quando voltava da escola, ela via uma vizinha belga que jogava ténis com o marido num court perto de casa. Todos os dias ele ficava a ver, descobrindo assim a sua paixão pelo ténis, até que a vizinha lhe disse que, já que ele ali ficava todos os dias, podia fazer de apanha-bolas. A relação desenvolveu-se, e no regresso de uma das suas viagens à Bélgica, a senhora trouxe-lhe uma raquete (na altura, daquelas de madeira) para que ele pudesse começar a jogar. Coisa que ele fez, e com qualidade suficiente para que o seleccionador de ténis da Costa do Marfim o convidasse para ir treinar com ele.
As coisas correram bem. Fez torneios com bastante sucesso em todos os escalões, tournou-se um dos melhores jogadores da região de África Ocidental, e encontrou um dia um senhor francês que o apadrinhou. Quando tudo estava preparado para ele partir para França, por intermédio do seu "padrinho", para poder então dar outra dimensão ao seu jogo, o senhor ficou doente. Ao partir para França para se tratar, disse-lhe que quando voltasse, seria a vez dele partir. Nunca voltou: em duas semanas o cancro do pulmão levou a melhor. E assim o Souleiman perdeu para sempre o bilhete que o poderia ter levado bem mais longe do que a dar aulas no Club de Tennis du Vallon.

Títulos simplificados

É o dever dum jornal informar, mesmo que por vezes tal signifique descodificar o seu próprio conteúdo.
Assim, um dos artigos que li recentemente dizia respeito às fístulas obstétricas, que em África têm frequentemente origem nos rituais de mutilação feminina, e o título do artigo era exactamente"Fístulas obstétricas".
Percebendo que tal seria de difícil compreensão para uma parte significativa dos leitores, o jornal resolveu colocar um parêntesis com a simplificação do título, que era então "quando as mulheres fazem chichi nelas próprias". É ou não mais perceptível?

Dormir

Após uma semana de muito trabalho, hoje tive um final de dia com ténis, um jantar com um bom vinho australiano e uma sessão de televisão estendido no sofá.
Agora sinto-me cansado e apetece-me dormir. Dormir com o prazer de saber que amanhã não há despertador. Dormir com o sentimento de ser "até quando acordar". Boa noite.

Com'zones

Anteontem foi um dia importante para a Costa do Marfim, que se espera ter continuidade nas próximas eleições.
A zona norte do país, dede a guerra civil e até agora, era controlado pelos rebeldes, as chamdas com'zones (zonas controladas por um comandante Forces Nouvelles).
Ora, no caminho para as eleições, previa-se que essas zonas deixassem de ser controladas pelo exército rebelde e que passassem ao controlo civil dos municípios: foi o que começou a ser feito anteontem, com a passagem de testemunho do comandante que controlava Bouaké ("sede" dos rebeldes) para o presidente de município.
O sinal é bom, e foi amplamente divulgado com uma grande quantidade de optimismo. Agora é esperar que tenha sido um primeiro bom passo para um excelente final.

Títulos de propriedade

Um dos problemas em África, já notava Ryszard Kapuscinski no seu livro "Ébano", é a ausência de títulos de propriedade sobre uma grande parte do território. Tal faz com que um proprietário dum terreno, por maior que ele seja, não possa apresentá-lo como uma garantia para obter um empréstimo no banco, por exemplo.
Agora há aqui uma campanha que visa resolver esse problema, que incita as pessoas a registarem as suas propriedades. E aquilo que pode parecer uma mera formalidade, poderá provocar uma cascata de acontecimentos que farão muita diferença.

Discurso de Deus

No jornal de hoje vinha um comunicado de Deus. Tal e qual: um suposto profeta recebeu uma mensagem de Deus, que lhe pediu para a disseminar por todos os meios de comunicação. No jornal, vinha o discurso escrito.
Basicamente, Deus dizia que a população da Costa do Marfim pode dormir descansada, pois os rumores de se estar a preparar um ataque contra o país não serão confirmados. Ele não deu ordem alguma para que tal acontecesse, portanto não acontecerá.
Escrevo isto não como crítica ou desconfiança sobre o profeta ou Deus, apesar de não acreditar em nenhum dos dois. Mas achei curioso o destaque dado à notícia, praticamente como se fosse um discurso do Presidente da República, e ainda mais porque nunca tal tinha visto. Estes pormenores dizem muito da cultura dum povo.

Chuva pela manhã, trovoada à noite

Hoje acordei ao som da chuva. Aliás, acordei com o som da chuva.
Pois o dia começou com um dilúvio. Um daqueles que coloca uma cortina cinzenta e espessa entre nós e o resto da cidade. Daqueles que inunda a cidade. Daqueles que bate com força nas janelas sem estores nem cortinas, e que por isso nos acordam.
Para acabar o dia, tive direito a uma trovoada que deixa a cidade às escuras... Mas entretanto passou, e neste momento está tudo calmo.

Chocolate

Quem diria que comprar M&Ms era tão difícil? Ora, no mesmo local, duas caixas registavam preços diferentes. Após algum discussão, venceu o preço que estava escrito no pacote. Mas a saga não terminara ainda: não foi possível ter o recibo correspondente, porque a caixa que dava o preço certo já estava fechada.
Assim, ou pagava o que dizia a caixa mais cara, ou peço o recibo na próxima vez que lá for. Pelo menos o chocolate estava dentro da validade.

TV em casa

Finalmente, tenho televisão em casa. Após mais uma tentativa, e não sem algumas dificuldades, consegui que me viessem instalar tudo o necessário para ter acesso a umas dezenas de canais. Claro que apenas vou utilizar uma meia dúzia, e claro que todos os filmes e séries são dobrados em francês.
Mas sempre serve de entretenimento, companhia e dá para ver as notícias. Além do mais, também dá para ver desporto, o que até vem a calhar para acompanhar o Roland Garros que começa amanhã e a final da Liga dos Campeões na quarta feira. É para ir amortizando.

Casa del Habano

Acabo de eleger o "Casa del Habano" como o meu bar de eleição. É um bar para fumadores de charuto, como o nome poderá indicar, mas não só. Tem estilo, tem bom ambiente... e é a distância de caminhar de casa.
A zona onde habito é muito calma, à noite e fim de semana. Mas há alguns locais bons, como este descoberto há pouco tempo. Fui lá a primeira vez com um amigo de Abidjan, mas fiquei fã. Tem uns sofás hiper conforáveis, óptima decoração, boa música e revistas e livros excelentes.
Além do mais, as pessoas que o frequentam definem-se como um clube de amigos, que me recebeu de braços abertos. Gosto.

Pares

Mais uma evolução na minha "carreira" de ténis: hoje fiz o primeiro jogo a pares. E foi bem engraçado.
Jogar a pares faz-nos explorar novas zonas do terreno, novos movimentos, o que é bom. Mas acima de tudo, introduz a componente de jogo de equipa, de que eu gosto particularmente.
Hoje foram pares criados no momento, sem nos conhecermos propriamente em termos de jogo, mas correu bem. Julgo que será ainda mais interessante se se tiver um grupo fixo, em que o entendimento entre colegas de equipa tenderá a crescer. É uma experiência a repetir.

Cartazes

Primeiro o problema: SIDA. Agora os factos: estima-se em cerca de 4% a taxa de infecção pelo HIV na Costa do Marfim (0,5% em Portugal, para comparação). Finalmente a solução: abstinência e fidelidade.
Claro que esta não é "A" solução preconizada, felizmente, mas é a solução apresentada em bastantes cartazes que por aqui andam disseminados. Que seja apoiada por estruturas religiosas, não me parece estranho. Mas por ONG que não estão ligadas à religião já é mais bizarro, apesar de me parecer o caso.
É claro que a fidelidade e, sobretudo, a abstinência poderiam resolver o problema. Também é claro que são soluções bem menos razoáveis do que o uso de preservativo. E assim, exceptuando alguns casos mais raros, os cartazes acabam por ser um motivo de riso, mais do que reflexão: acho que terão um mau retorno do investimento.

Televisão

Desde que aqui estou, nunca instalei os canais de televisão. Por um lado, por não passar assim tanto tempo em casa. Por outro, porque para o fazer teria de me deslocar à sede do "Canal Horizons", e nos horários de expediente eu estou a trabalhar.
Mas hoje apanhei-me mesmo ao lado do prédio e decidi lá ir subscrever o serviço. Até fiquei contente: afinal será uma forma de rentabilizar a televisão (aparelho) que aqui tenho, e entretanto é a final da Champions League.
Só que mais uma vez, da mesma forma em que nos supermercados escolho sempre a caixa mais demorada, tive azar: hoje a ligação internet estava em baixo, e eles estavam sem sistema. Será um sinal?

Duche

Que calor! É certo que já estou relativamente habituado, pelo que não poderei falar de sofrimento, mas que está quente, está.
Além do mais, é húmido, o que faz toda a diferença. Nos últimos dias, a vontade é tomar um duche de água fresca a cada meia hora. Uma simples exposição ao sol, faz suar e ficar com a roupa colada ao corpo. Eu sei que não é muito agradável imaginar isto, mas é verdade.
Na ausência de chuveiros portáteis, há que aproveitar os espaços com ar condicionado, e passar no duche à hora de almoço.

Serviço

O serviço no bar do hotel, onde fui almoçar hoje, deixou muito a desejar. Talvez fosse pelo barulho ensurdecedor e peripécias várias dos convidados do casamento que lá decorria. Devo reconhecer que não era fácil aguentar, sem um iPod nos ouvidos a berrar-nos uma boa música.
De qualquer forma, os empregados supostamente são profissionais, e por isso deviam manter um determinado nível de prestação. Deviam...
Além de terem confundido fiambre com queijo, demoravam imenso, traziam as coisas a conta-gotas e pareciam com medo que o serviço não fosse pago. Aliás, no momento em que meti a mão no bolso para tirar a carteira (mas o empregado não sabia o que iria sair dali), nem tive tempo de a retirar e já ali estava o homem ao lado pronto a receber. Parei e olhei para ele com ar "O que raio está aqui a fazer especado ao meu lado que quase não tenho espaço para tirar a mão do bolso?". Muito solícito, e talvez pensando que aquilo fosse uma hesitação, ele apressou-se a pegar na conta e leu-me o montante total. Que belo serviço!

Shelby

Shelby: se apreciam automóveis, este nome dir-vos-á certamente algo. Ou então se se recordam da Eleanor, no filme "60 seconds" com o Nicholas Cage e Angelina Jolie.
A versão actual do Mustang Shelby é o GT500. É um super desportivo, de altíssima performance, com um design que pode não ser consensual, mas que não deixa ninguém indiferente.
Pela primeira vez, vi um. Hoje. Um Shelby GT500 em Abidjan! Deixarei de lado a minha opinião enquanto amante de automóveis, mas não deixo de exprimir a minha surpresa por ver um destes aqui.
Não propriamente por não imaginar que alguém cá tenha meios para comprar (e manter) um carro destes. Como em todo o lado, existem algumas pessoas que o podem fazer. Mas antes por, conhecendo algumas das melhores ruas do país, imaginar que será sempre um carro castrado, a fugir de buracos que podem facilmente destruí-lo consideravelmente. Sempre é uma forma de o manter dentro dos limites de velocidade...

Hora de fecho

A seguir ao jantar, sabe bem tomar um cafézinho. E ultimamente tenho-o feito, indo ao hotel que fica mais perto de minha casa.
De cada vez que lá vou, penso no quão imperativo é comprar uma máquina de Nespresso só para mim, coisa que nunca fiz. Por enquanto, aproveito para esticar um pouco as pernas e vou ao bar do hotel.
Mas convém calcular bem a saída, porque apesar do horário oficial de encerramento ser às 23h, não é uma certeza. Depende da clientela e como regularmente não tem muita, fecham mais cedo. Hoje cheguei lá às 22:30h, e já tive de pedir com jeitinho. Nada que não se resolvesse com mais uns trocos, tendo o empregado se disponibilizado para ficar mais um pouco se fosse preciso... dentro do horário, com certeza. "Não é preciso, obrigado": o café já estava na mesa.

Eleições: nova data

Nova data para as eleições definida: 29 de Novembro.
Esta é uma data importante. Poderá ser a data zero para a Costa do Marfim, para um recomeço. Após a guerra, sente-se que há muitas empresas, muitos negócios que se estão a posicionar, mas cuja luz verde para o investimento serão umas eleições bem passadas. Eu diria até que, mais do que ganhar um ou outro, o importante é que sejam feitas e reconhecidas.
Em termos do processo de identificação, julgo que até lá estará concluído. Não foi um processo totalmente pacífico, mas com o tempo foi-se completando e actualmente a zona de Abidjan julgo que está praticamente finalizada.
Claro que é sempre preciso prestar atenção a alguns sinais. Afinal, são umas eleições num país africano com um historial recente de problemas. Mas tenho a esperança que tudo corra dentro da normalidade, e que ainda venha a assistir ao desabrochar do país.

Vestido azul

Como poderão imaginar, os bronzeadores aqui não têm grande procura. Pelo contrário, os produtos que servem para clarear a pele são bastante procurados.
Há vários, e com painéis publicitários sempre bastante sexys (ainda que possam não o ser para a nossa sensibilidade estética). No entanto, há agora uma publicidade nova a um produto chamado "Palmas" e que não é sexy: é bem mais do que isso, tocando ao de leve a pornografia.
A primeira vez que o vi, pensei ter visto mal. Mas agora está mais do que confirmado: a jovem está mesmo de gatas e pernas abertas, desculpem-me o grafismo. E tem um vestido azul.

Regresso do sol

Hoje esteve um dia lindo. A chuva, que marcou presença nas últimas semanes, deu uma trégua e tivemos um dia absolutamente solarengo.
De nuvens, nem sinal. E por isso, o sol pode aparecer em todo o seu esplendor, banhando a cidade duma luz imensa. Apesar do calor, os dias e a própria cidade tornam-se mais alegres. Dá até vontade de andar a pé na rua, ideia que é rapidamente afastada pela temperatura e substituída por outra actividade mais calma, ou por um carro com ar condicionado.
Vamos a ver como estará amanhã, pois não surpreende que esteja uma tempestade tremenda.

Prédio

O prédio diante da minha janela deve estar prestes a implodir. Ou pelo menos a desmontar-se.
Desde há algumas semanas que, dia e noite, está em obras no interior, nos andares superiores. E durante todo o tempo, há detritos a saltar janela fora, camiões a chegar para os levar a todo a hora, e trabalhadores com presença constante.
Assim, parece-me que o prédio está a ser desmontado por dentro, e ao contrário do que vemos normalmente em Portugal, aqui não há ninguém que pareça seguir a obra na condição de engenheiro. Por isso, não tenho a certeza se o que salta pela janela fora não são pedaços de colunas e vigas.
O melhor mesmo é ter cuidado. E já agora, nos andares acima do meu também andam em obras, mas por enquanto as janelas estão fechadas.

Gémeos

Eu e o meu colega e amigo que está actualmente comigo em Abidjan temos gostos bastante parecidos. Por vezes, assustadoramente parecidos. Em termos fisionómicos, posso admitir também algumas parecenças, mas há limites...
Vem isto a propósito das vezes que já nos perguntaram se somos irmãos. Em algumas, aliás, nem perguntaram: assumiram. "O seu irmão ontem já pagou", foi uma das intervenções.
Mas o cúmulo de todas estas confusões passou-se hoje. Após termos ido almoçar ao bar dum hotel próximo de minha casa, cruzámo-nos com um senhor na rua que, sem qualquer aviso ou preliminar, atirou um "Vocês são gémeos?!?". Pois não somos, mas qualquer dia fico com dúvidas.

Dia bem passado

Este sábado foi um dia muito bem passado. Leitura, desporto, sol e um vento muito agradável, fizeram de hoje um dos dias mais simpáticos dos que aqui já passei.
A saída de casa foi ao final da manhã. Dirigi-me ao clube de ténis, que é um espaço acolhedor, com jardins, piscina e bar. Joguei ténis de manhã, depois passei horas a ler, almocei às quatro da tarde acompanhado de banho de sol, e acabei a tarde numa bela partida de ténis com um amigo. Para terminar, uma sessão de cinema.
Gostei. Estava a precisar. Agora segue-se uma bela noite de sono, sem despertar marcado para amanhã.

Final de noite

Para variar, hoje fui sair. Descobri um bar perto de casa bem agradaável, que é um clube de charutos e merece nova visita.
De seguida, fui a um bar-discoteca que não conhecia, do qual gostei bastante.
O que não variou muito foi o final da noite, que consistiu num shwarma. Claro que é daquelas coisas que qualquer consulta do viajante nos proibiria, mas sabe bem. E apesar de o fazer praticamente sempre que vou sair, nunca tive qualquer problema.
Qual será, aliás, a diferença para os cachorros das roulotes da zona industrial do Porto? Eu confesso que não tenho resposta. E enquanto assim for, sempre vou dormir consolado.

Banho

Parece que a época de chuvas chegou em força. Nos últimos 3 dias tem chovido muito frenquentemente, e sempre em grande quantidade. O que tem algumas vantagens.
Ontem já de noite, da janela da minha sala, deu para ver várias pessoas a tomar banho e a lavar a roupa debaixo do "chuveiro" criado pelos canais de escoamento de água do telhado dum edifício. Foi a primeira vez que vi tal coisa, mas não é mal pensado. E como não está frio, até é capaz de ser agradável. Têm é de trazer champô e sabão para a próxima.

Barça!

O Barcelona passou à final da Liga dos Campeões, ao empatar já nos descontos com o Chelsea, em Londres. O mais giro disto é que vi os minutos finais em casa de alguém que não conheço, mas que me abriu a porta, deu-me um lugar no sofá e no fim disse para aparecer quando quisesse.
O desporto é um fenómeno verdadeiramente unificador. Seja qual for a nacionalidade, há momentos em que a linguagem se torna comum, os países não existem, e o convívio franco aparece.
Desde que aqui estou, foi a primeira vez que vi um pouco de futebol da Liga dos Campeões na televisão. Mas valeu sobretudo por esses momentos, ainda que aquele golinho tenha ajudado porque toda a gente torcia pelos catalães.

Pedaço de Portugal

A partir de hoje, e durante algum tempo, tenho um colega e amigo português em Abidjan. E apesar das novas tecnologias me aproximarem de Portugal e do português, reconheço que é reconfortante.
Estes são os momentos em que realmente me apercebo do quão diferentes são as culturas, e sobretudo do quão identificado me sinto com aquela que é a minha cultura. Por melhor que me tenha adaptado, nestas alturas tenho sempre a sensação de regresso.
São as conversas casuais em refeições partilhadas, são as expressões, as piadas, que nos identificam e nos posicionam no mesmo comprimento de onda. É um pedaço de Portugal em solo estrangeiro. E é bom.

"Diversos"

Um litro a cerca de 1.500€: parece que é esta a tabela para sangue humano, segundo o jornal de hoje. Peço desculpa aos mais impressionáveis (decerto deveria ter dito isto antes, porque se forem muito impressionáveis já não chegam aqui...), mas é também destas coisas que se compõe a realidade aqui.
Aparentemente, havia uma rede para colheita de sangue humano aqui na Costa do Marfim, sendo depois enviado para outros países da região. Não sei quais eram os critérios para escolha das vítimas, se é que os havia, ou qual a finalidade do sangue. O certo é que a magia e o feitiço em África assumem outra expressão, e os Dr. Bambo da praça são de outro campeonato. Além de que não vêm anunciados nos "Diversos".

Inveja

Diz-se que a inveja é um sentimento muito feio sendo, aliás, um dos sete pecados capitais. Eu confesso que por vezes lá cedo (como gostava de ter passado esta tarde numa esplanada na Foz!), mas há invejas que me incomodam profundamente.
Apenas hoje me familiarizei com o fenómeno de Susan Boyle, pelo blog duma amiga. Não estou aqui para a defender, mas li no site do video com a actuação dela comentários como "eu, como cantor profissional, vejo bem a enormidade de erros que ela comete" ou "isto é um insulto para nós cantores profissionais, que trabalhamos dignamente para alimentar as nossas famílias, enquanto estas pessoas se aproveitam destas oportunidades".
Estes comentários incomodam-me. Da mesma forma que me incomoda quando se atacam jogadores de futebol pelo dinheiro que ganham. Ou gestores pelos seus salários.
Mais uma vez, não estou aqui para defender uma pessoa nem uma classe. Mas sempre que tive esta discussão com alguém, ninguém me disse que recusaria um tal salário, ou uma tal oportunidade.
Incomoda-me ainda mais quando se entra em juízos de valor sobre as pessoas em causa, sem as conhecer. Porque aproveita a oportunidade, é desonesta. Porque aceita ganhar o que ganha, é um ladrão.
Para mim, há no meio disto tudo duas coisas muito importantes: uma é o mérito, outra é que os salários e as oportunidades existem porque alguém aceita providenciá-las. E incomoda-me que a crítica venha tão frequentemente não da razão, mas da inveja.

Sofá

Sofás são uma perdição. Julgo que não é apenas para mim, mas eu por mim falo: tenho alguns sofás na minha vida que me fazem dormir com gosto.
Vem isto a propósito da sesta (tardia) que acabo de tirar no sofá aqui de casa. Não é especialmente confortável, pelo que não acontece frequentemente, mas foi bom. E fez-me relembrar certos sofás onde me sinto afundar numa aconchegante melancolia, por vezes independentemente de tudo o que se passa à volta, e dormir.
Deve ser por isto que mesmo em casas pouco mobiladas, não pode faltar esta peça. Porque não é decoração ou conforto, mas sim necessidade e prazer. Ora pensem se não têm pelo menos um sofá na vossa vida?

Origem controlada

No meu frigorífico está uma garrafa que acho muito estranha. O alegado produto é mais do que conhecido (Coca Cola), mas a embalagem intriga-me.
Acho que a Coca Cola, quer se goste ou não, está tão enraizada nas nossas vidas que seria muito estranho se de repente deixassemos de ver aquelas garrafas tão conhecidas. A que tenho no frigorífico, parece-me um híbrido.
É uma garrafa de de 1 litro em vidro, mas tem uma tampa de plástico como as comuns embalagens plásticas. Eu não quero ser demasiado desconfiado, mas se por aqui existem Mercedes e BMW falsificados, porque não Coca Cola pirata?
Não fossem estas interrogações e até bebia um copo. Assim, vou ficar-me pela água de origem controlada.

Distrair

Há já algum tempo que não me deitava tão tarde. Tenho andado cansado, e por isso tenho sido madrugador não só a levantar-me, mas também a deitar-me.
Hoje, e visto que amanhã é feriado, concedi-me mais umas horas de lazer na companhia da "Grey's anatomy". Claro que são episódios repetidos, já não tenho a certeza se é a segunda ou terceira vez que os vejo. Mas eu finjo que não conheço, e dá para distrair um bocado.